Sombra Fútil Chamada Gente

Quantas vezes, sozinho na minha cama, pouco antes de dormir, chorava feito criança relembrando-me “O tempo em que festejavam o dia dos meus anos”. Lembrando-me do doce e terno colo da minha mãe, da minha irmã tão meiga e gentil, do meu irmãozinho, do meu padrasto que me fora pai… Pedia a D-us, então, que me fizesse voltar para lá “por uma viagem metafísica e carnal”, quando era menino e “tinha a doce saúde de não perceber coisa nenhuma”. E, afinal, percebendo a impossibilidade de realizar o meu desejo, via-me com “raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira”.
Então, no decorrer dos dias, percebia que em mim, só havia “sobretudo cansaço” e que todas as coisas produziam em mim cansaço.
Passei os meus dias a ser um fingidor, rascunhando os meus versos, até que finalmente percebi que, desse modo, estava quebrando a ordem do meu companheiro Campos: “Não saúdes como eu a morte em literatura!”. Entretanto, que mais eu faria? Restava-me compor “a dor que deveras sente”.
Por fim, compreendi que o ser humano é “cadáver adiado que procria” e, portanto, não há razões para continuar vivo. Porquanto, a vida é um constante sofrer, “ninguém faz falta”, “pouco te chorarão ”, melhor é dar logo cabo dela! Pensei eu: “Se queres matar-te, mata-te! [...] Ó sombra fútil que se chama gente”, afinal, “sem ti, tudo correrá sem ti”. Pensando assim, viver é postergar o sofrimento, pois marchamos todos em direção ao abismo, então levar “o óbolo ao barqueiro sombrio” é, simplesmente, adiantar serviço a Átropos.